sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Pau que nasce torto, não tem jeito, morre torto! Os canais das barragens do Santa Maria

Notícias publicadas hoje nos meios de comunicação (ver abaixo) informam que o estado do RS vai liberar R$ 8,6 milhões para a implementação da irrigação. A divisão dos recursos é assimétrica: apenas R$ 600 mil irão para a execução da Fase I do Plano Estadual de Irrigação. Os demais R$ 8 milhões, para os projetos executivos dos canais das barragens dos arroios Jaguari e Taquarembó.
Estes canais, tiveram seus custos estimados em R$ 90 milhões para a barragem do Taquarembó, e R$ 60 milhões para a do Jaguari - R$ 150 milhões, portanto, elevando astronomicamente o custo dos aproveitamentos (ver postagem neste blog de 16/1/2011 - 1 ano atrás - com título 

Barragens Jaguari e Taquarembó custarão mais caro do que o previsto: o mesmo filme, de novo!).

Porém, o projeto executivo de R$ 8 milhões prevê "a reavaliação dos projetos originais com o objetivo de ampliar a área irrigada e diversificar a lavoura". E que esta "reavaliação" teria sido proposta pelos "beneficiários do Comitê da Bacia" do rio Santa Maria. Na verdade, trata-se de uma proposta da Agência de Usuários de Águas da Bacia Hidrográfica do rio Santa Maria - AUSM que organiza a parcela dos usuários de água do CBH Santa Maria. No seu site pode ser conhecida a sua proposta e cogitar os seus antecedentes e causas. 
Em entrevista a uma rádio de Dom Pedrito, em 9/1/2012, os representantes da AUSM, diante de representante do governo do estado, informaram que ao cadastrarem os interessados a usar as águas da barragem do Taquarembó para irrigação, estes demandaram o equivalente a 11.000 hectares de arroz irrigado, enquanto a barragem teria capacidade para irrigar 15.000 ha. Ou seja, não haveria interesse em usar toda esta água. Como disse o dirigente máximo da AUSM, "a água está sobrando na barragem do Taquarembó". Não existe subsídio melhor para sustentar que o arroz não gera renda, e que a tendência na bacia é a redução da área cultivada, com conversão de parte das áreas para outros usos com menor consumo de água, o que fará com que "sobre água" não só na bacia do Taquarembó, mas em todo o Santa Maria.
Em virtude disto, estariam optando pelo uso da água para outras culturas, que não o arroz irrigado, na tentativa de que a água seja efetivamente usada. Em função desta opção, estariam propondo um projeto alternativo de canal, que ao contrário do anterior - que passa pelas várzeas - passa pelas coxilhas, facultando o uso de água por outras culturas, supostamente fruticultura, pastagens, entre outras.   
Antes tarde do que nunca!
(Confesso que dá vontade, mas não vou tripudiar exclamando "eu não disse (e escrevi) neste blog?. Que o arroz não gera renda que justifique este tipo de empreendimento?") 
Louvo, portanto, que os dirigentes da AUSM - antes tarde do que nunca! - reconheçam este fato que já era conhecido pelos especialistas que merecem este nome, e que não estão subordinados a interesses pessoais e espúrios. Seria realmente excelente para a sociedade gaúcha se esta água acumulada pudesse ter usos alternativos, que gerassem efetivamente renda e emprego, e alterasse o perfil econômico deprimido da maioria dos municípios da região beneficiada. 
Porém, diz o ditado popular, "Pau que nasce torto, não tem jeito, morre torto" Ou, outro ditado, "Pior a emenda que o soneto". Empreendimentos deste tipo, que alteram significativamente o ambiente, o regime hídrico, e que visam a alterar para melhor a economia regional, têm que ser planejados sistemicamente: ou seja, como um todo; considerando a demanda e a oferta de água - planejando a primeira com tanto ou maiores detalhes, do que é feito  com a segunda. Fazer uma parte pensando em uma coisa (irrigar arroz), para depois força-la a fazer outra (arroz e culturas de terras altas) certamente não é boa decisão. 
Infelizmente, o RS importou um vício que sempre identificou nas obras do Nordeste Brasileiro: planejar obras caras de incremento das disponibilidades hídricas, entendendo que a demanda um dia vai aparecer, naturalmente. Às vezes, infelizmente, não aparece, ou demora a aparecer, ou aparece em outro lugar. Para maus administradores públicos isto não é qualquer problema: o que interessa é fazer a obra e inaugurar (a pedra inaugural, o túnel, o maciço da barragem, e finalmente a obra completa!). Se nada acontecer como previsto não há problemas: a obra serviu aos seus interesses (no sentido amplo ou restrito, confessáveis ou nem tanto) e, afinal, ninguém vai se lembrar no futuro. E sempre dá para acusar os futuros administradores pelas coisas não ocorrerem "com foi planejado", mesmo nada tendo sido planejado, como nesse caso.
Uma análise da proposta do canal alternativo proposto pela AUSM
Na própria página da AUSM é apresentado o detalhamento da proposta do canal. E a comparação entre o que era originalmente proposto, com custo informado de R$ 150 milhões, e a alternativa da AUSM. A Figura abaixo apresenta estas diferenças.
Em termos gerais a área irrigada é aumentada em 8 vezes - de 14.540 ha para 119.500 ha, e a extensão dos canais em 3,6 vezes: de 82 km para cerca de 300 km. 
Inicialmente cabe uma grande perplexidade. O governo anterior, em sua página-web e em reportagem   apresentada pela Zero Hora, afirmava que a barragem do Jaguari irrigaria 17.000 ha (ver 
As barragens da bacia do rio Santa Maria e a seca do verão-outono de 2009) Como agora anunciam que será apenas 1.540 ha? Será que a barragem teve sua cota e armazenamento reduzidos devido aos problemas de fundação, que foram também comentados neste blog (ver a inserção acima e outras)? Ou que, outra suspeita reiteradamente apresentada neste blog, o governo anterior falseou os dados para "vender" a obra politicamente? Quem pode explicar?
Outro dado que chama a atenção é a área beneficiada: quase 120.000 ha. Como a mesma água que pretensamente poderia irrigar 15.000 ha de arroz irá irrigar área 8 vezes maior? Estarão pensando em adotar na bacia apenas irrigação por gotejamento, aquela mais eficiente no uso de água? Pensam apenas em irrigar frutas? Haveria mercado no país para 120.000 ha irrigados de frutas? Realmente, não dá para entender!
O que chama atenção, pelo lado dos custos, é que os canais projetados originalmente, com 82 km custariam R$ 150 milhões. Quanto custarão os canais da proposta da AUSM com extensão de 300 km? A lógica leva a se realizar uma regra de 3, resultando em algo próximo a R$ 550 milhões! Por outro lado, este valor deve estar subestimado. Os canais anteriores foram projetados - pelo menos assim se espera - para minimizar os custos globais dos empreendimentos. E, como afirma o dirigente da AUSM na entrevista acima referenciada, eles passam por áreas de várzea, caracterizadas por solos mais fáceis de se trabalhar, já estabilizados. Ao se pretender passar pelas coxilhas, como é afirmado, os custos por km aumentarão, tanto por demandas de escavação em pedra, quanto por necessidades de estabilização, entre outras demandas. O mesmo dirigente, na mesma entrevista, julga possível tornar menor o custo desses canais fazendo-os sem revestimento! Infelizmente, não existe esta possibilidade, especialmente em solos de coxilhas: problemas de infiltração fariam a água "sumir" e a erosão "sumiria" com o próprio canal, nas partes com maior velocidade do fluxo. 
Além disto, quem sabe da vocação para irrigação em terras altas das áreas que se pretende beneficiar? Existirá esta vocação? As barragens foram projetadas para irrigar as várzeas e não as coxilhas. Estarão elas lá disponíveis, com solos com aptidão adequada? 
Eu até gostaria de poder torcer para que esta alternativa pudesse ser viável, para benefício da região que necessita de investimentos para mudar seu perfil econômico. A irrigação de terras altas seria certamente uma alternativa. Mas não posso deixar de comentar que esses certamente mais de R$ 500 milhões poderiam alavancar investimentos alternativos que melhor atenderiam a esta demanda. E para isto, deve haver um projeto de irrigação que planeje pelo lado da demanda de irrigação em terras altas, primeiro, para depois planejar pelo lado da oferta, barragens e seus canais. Os R$ 500 milhões poderiam ser mais bem aplicados desta forma, e não para colocar um remendão em empreendimento mal concebido, projetado e desenvolvido.
Deve ser reconhecido porém - e a história dessas barragens comprova - que racionalidade técnica e econômica não fazem parte das condições essenciais que embasam as decisões políticas. Se fossem, algo que fica cada vez mais claro agora, estas barragens não teriam sido sequer cogitadas. Sendo assim, a única esperança de que esses canais alternativos venham a ser construídos, incrementando o desperdício de recursos públicos, seria contarem com um respaldo político que a região está longe de poder mobilizar. Em outras palavras, os representantes políticos da região não têm força suficiente para negociar com o Governo Federal o investimento de recursos deste porte, e com esta falta de qualidade. Mas posso estar enganado - infelizmente, sou sempre surpreendido pela capacidade do nosso meio político tomar decisões equivocadas, perdulárias e irresponsáveis.
Para resumir: infelizmente, as barragens do Jaguari e do Taquerembó ficarão como um mau exemplo de aplicação de recursos públicos, e a região perderá os recursos que, bem utilizados, conseguiriam alavancar o seu desenvolvimento sustentável. E ninguém será responsabilizado por isto! (ou, quem sabe, tentem me responsabilizar por ter denunciado este "samba de consultores doidos"?)

Estiagem - 20/01/2012 16h02
Atualizado em 20/01/2012 16h11

Governo do Estado libera R$ 8,6 milhões para o Plano Estadual de Irrigação

Anúncio aconteceu nesta sexta-feira, no Plenarinho da Assembleia Legislativa, durante reunião sobre estiagem.


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Da Redação



Porto Alegre
  - O secretário de Obras Públicas, Irrigação e Desenvolvimento Urbano, Luiz Carlos Busato, anunciou em reunião da Comissão Representativa da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul que o Ministério da Integração Nacional vai liberar R$ 8,6 milhões para a irrigação no Estado. Destes, R$ 600 mil serão para a execução da Fase I do Plano Estadual de Irrigação e R$ 8 milhões para os projetos executivos dos canais das barragens de Jaguari e de Taquarembó. O anúncio aconteceu nesta sexta-feira, no Plenarinho da AL, durante a reunião sobre estiagem.

Busato destacou que na Fase I do Plano serão definidas as diretrizes da forma como Estado irá nortear o processo de irrigação. "A previsão é que o termo de referência esteja pronto em 30 dias. A partir daí em seis meses o plano deverá estar pronto. É importante destacar que todos os agentes Coredes, Comitês de Bacias, produtores e secretarias de Estado estão envolvidos nesse processo."
O secretário destacou ainda que na próxima terça-feira o termo de referência dos projetos executivos dos canais das barragens de Jaguari e de Taquarembó será entregue pelos técnicos do Departamento de Irrigação da SOP em Brasília. "No recurso está prevista a reavaliação dos projetos originais com o objetivo de ampliar a área irrigada e diversificar a lavoura. Sugestão dada pelos beneficiários do Comitê da Bacia de Santa Maria."
"Estamos também trabalhando de forma efetiva nas ações de combate à estiagem. Para isso estamos atendendo emergencialmente os municípios com a cedência de máquinas, reformas de poços e implantação de Redes de Abastecimento de Água", explicou o gestor estadual. Participaram da reunião o presidente da Casa, deputado Adão Villaverde e a Comissão Representativa, colegiado formado por 15 parlamentares e mais o presidente do Parlamento, que responde pelas ações da Assembleia durante o recesso parlamentar.
Ações a médio e longo prazo
Para o Plano Estadual de Irrigação, a SOP está elaborando um estudo técnico analisando os aspectos físico-ambientais, climatológicos, socioculturais, econômicos, institucionais e legais de cada região visando transformar os problemas locais, relacionados à demanda de água, em políticas de Estado. Para alcançar esse objetivo a Secretaria busca envolver no processo os principais atores, entre os quais os 25 comitês de Bacias Hidrográficas. Entre os objetivos do Plano Estadual de Irrigação estão: a diversificação das culturas do Rio Grande do Sul; garantia de expansão de água; mais condições de financiamento; adaptação das políticas para atender problemas climáticos.
Fonte: http://www.jornalnh.com.br/Estado/368760/Governo-do-Estado-libera-R$-8,6-milhoes-para-o-Plano-Estadual-de-Irrigacao.htm

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