Confirmando essas desconfianças, a Polícia Federal começa a desvendar o jogo de interesses envolvidos, conforme mostra a reportagem do jornal Zero Hora de domingo de Páscoa.
Fonte: Zero Hora 12 de abril de 2009 | N° 15936
OPERAÇÃO SOLIDÁRIA
Investigação da PF envolve secretário
Porto é suspeito de fornecer a empresas informações privilegiadas sobre licitações
Sete novas investigações estão em andamento na Polícia Federal (PF) em decorrência da Operação Solidária.
Em uma delas, o inquérito referente às barragens dos arroios Jaquari e Taquarembó, um secretário estadual e uma ex-secretária estão sob investigação: Rogerio Ortiz Porto, da Secretaria Extraordinária de Irrigação e Usos Múltiplos da Água, e Rosi Bernardes, ex-secretária-adjunta da Secretaria de Obras Públicas. Rosi saiu da secretaria em março deste ano.
Os dois são suspeitos de ter fornecido, no ano passado, informações privilegiadas sobre o processo de licitação e de ajudar a concretizar interferências nos termos dos editais para beneficiar empresas. Há diálogos interceptados com autorização judicial indicando a suposta atuação de Porto e de Rosi em benefício de empresários investigados. As conversas também apontam que o deputado federal Eliseu Padilha (PMDB) seria um dos maiores articuladores em prol do direcionamento do resultado da licitação.
– Nunca houve intenção de direcionar (a licitação). Nunca ninguém me pediu isso. Nunca tive contato com Camino – disse Porto.
Considerado o maior investimento em recursos hídricos no Estado, o projeto das barragens de Jaguari e Taquarembó tem 70% da verba oriunda do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e contrapartida do Estado. As obras têm investimento previsto de mais de R$ 150 milhões. Conforme provas coletadas ainda no âmbito da Solidária, um dos beneficiados para atuar no projeto seria o empresário Marco Antônio Camino, dono da MAC Engenharia, e o outro, Edgar Cândia, da Magna Engenharia.
Policiais suspeitam de ação para influir em concorrência
Diálogos interceptados pelos federais indicam que teria havido um acerto de Padilha com autoridades estaduais responsáveis por elaborar os editais para que os termos tivessem um determinado nível de restrição capaz de garantir a vitória de Camino e Cândia sobre outros eventuais candidatos na disputa.
– Já acertei tudo com Porto (seria uma referência ao secretário) – informa um dos investigados, em conversa com um empresário.
Em algum momento, porém, a situação teria fugido ao controle do grupo, o que teria motivado uma nova série de tratativas por meio de telefonemas e até encontros. Depois da publicação dos editais, as gravações da PF flagram suposta reação dos interessados.
– Do jeito que está, pode entrar a torcida do Flamengo inteira – teria dito o deputado Padilha a Camino.
Em outro diálogo captado pelos agentes com autorização judicial, os interlocutores já falam da possibilidade de os termos dos editais referentes às obras sofrerem modificações.
– Falei com o comandante lá, e ele está disposto a publicar uma errata – diz um dos interlocutores.
Os editais para construção e fiscalização das obras das barragens foram publicados no Diário Oficial do Estado em 9 e 30 de maio do ano passado. Em 6 de junho, foram publicados quatro avisos de prorrogação de prazo referentes às licitações que haviam sido noticiadas em 9 e 30 de maio. A justificativa para as prorrogações, conforme o próprio texto, é de que houvera “alterações nos editais”.
Autoridades solicitaram outros inquéritos sobre grupo
Como Eliseu Padilha tem foro privilegiado por ser detentor de mandato de deputado federal, e já tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) um inquérito contra ele referente à Solidária, eventuais elementos relacionados a ele no inquérito das barragens serão reunidos em relatório pela PF e remetidos para Brasília.
A parte do inquérito relacionada ao secretário Porto, também detentor de foro, deve ser encaminhada ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Além do inquérito das barragens, a PF tem outras seis investigações em andamento que nasceram a partir de fatos apurados na Solidária. Entre as obras e serviços que levantaram suspeitas, estão o Programa Saúde da Família em Canoas, o Pró-Canoas, o Hospital de Pronto Socorro de Canoas e um trecho da RS-474 (trecho entre Morrinhos e Mampituba). Outros inquéritos já estão requisitados, mas a instauração ainda depende de diligências.
adriana.irion@zerohora.com.br
Contrapontos |
O que diz Rogerio Ortiz Porto, secretário estadual de Irrigação e Usos Múltiplos da Água |
A suspeita é sobre empresas que não tiveram ingerência nas obras. O que houve foi o seguinte: foram repostos os termos originais do edital. Aquelas alterações informadas nos avisos de prorrogação se referem apenas a erros de numeração de itens que foram corrigidos. Só isso. No caso de Taquarembó se repôs totalmente os termos do edital original. No de Jaguari saiu conforme foi editado pela Celic. O deputado Padilha nunca me pediu para interferir em nada. Comuniquei a ele e também ao Ministério da Integração Nacional que tinha havido tentativa de alteração do edital, com a qual eu não estava de acordo, e que eu estava repondo os termos originais do edital. Houve uma tentativa de publicar um edital flexibilizando para aumentar o número de empresas licitantes. No nosso conceito, era mais importante garantirmos a execução da obra do que ter uma montanha de licitantes. O que interessava era ter licitantes habilitados. Nossa preocupação era que só entrassem na licitação empresas que tivessem condições de construir. Repusemos os termos originais. Comuniquei ao deputado Eliseu Padilha que estava repondo os termos originais porque ele foi uma das pessoas que mais batalharam para liberar recursos do PAC para o Estado. Nunca houve intenção de direcionar. Nunca ninguém me pediu isso. Nunca tive contato com Camino. |
O que diz Felipe Pozzebon, advogado de Marco Antônio Camino, da MAC Engenharia |
Ele (Camino) é o maior interessado em esclarecer os fatos. Em relação às barragens, ele vai demonstrar a completa lisura das atividades da empresa dele em relação ao processo licitatório das barragens, e desde já refutamos completamente a ideia que se quer passar de ter havido algum acordo. Jamais houve acordo, conluio ou tratativas em relação à empresa dele procurando algum tipo de benefício em relação às barragens ou qualquer outra obra executada no âmbito de Canoas ou de outras cidades. Jamais houve qualquer tipo de favorecimento ou de conversa escusa. Ele e a empresa dele agiram sempre em estrito acordo com a legislação brasileira. |
Zero Hora contatou uma secretária de Edgar Cândia, da Magna Engenharia, e pediu entrevista, mas ele não deu retorno |
Uma funcionária da Secretaria de Obras avisou Rosi Bernardes de que Zero Hora gostaria de ouvi-la, mas ela não deu retorno. |
Zero Hora deixou recado no celular do deputado federal Eliseu Padilha, que não retornou. |
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